quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Palhaço Fofoquinha






Fofoquinha nasceu e cresceu dentro do circo. Foi seu pai quem escolheu o nome e decidiu como seria o espetáculo: O menino deveria aprender a chegar pisando tão de mansinho e tão escondidinho que surpreenderia a público, não importa em que lado do picadeiro estivesse sentado.
Fofoquinha passava os dias treinando o andar leve e surpreendia a trupe o tempo inteiro.
Como chegava sem ser percebido, acabava ouvindo coisas que não devia. Ouvia e falava, acabando sendo o centro de todas as confusões que aconteciam entre os componentes do circo.
As pessoas já tremiam com a sua presença! 
Fofoquinha cresceu, se tornou mestre na sua arte, mas foi odiado por todos com quem convivia.
Quando se tornou adulto, Fofoquinha resolveu tirar proveito da sua arte de chegar sem que fosse percebido para obter lucro fazendo chantagens, primeiro com os integrantes do circo, depois com os comerciantes das cidades por onde o circo passava.
Na passagem por Turumirum, Fofoquinha encantou-se pela filha do dono do armazém no dia em que ela veio assistir ao espetáculo, mas sabia que o namoro não seria aprovado pelo pai da moça, portanto, resolveu seguí-lo para obter alguma vantagem extra.
Logo Fofoquinha descobriu que o pai da sua pretendida tinha uma paixão secreta pela mulher que trabalha na secretaria da igreja local, quinze anos mais nova que ele, e que se encontravam secretamente na sacristia da igreja, tendo como fruto dessa relação uma linda menina de cinco anos chamada Alizandra.
Foi o suficiente para garantir o namoro, o noivado e o casamento que aconteceu no mês em que o circo ficou na cidade.
Casado, Fofoquinha tinha pouco o que fazer, pois a cidade era pequena e o sogro sempre deu conta do pequeno armazém. Passava o dia tomando conta da vida da coitada da mulher que passava o dia olhando por de trás dos ombros tentando surpreender o marido.
Ao irem se deitar, Fofoquinha fazia o relatório para a esposa:
- Rosinha, ocê sabe que hoje descascou a cenoura e jogou um pedação bom fora? Ocê colocou muita manteiga na farofa, num podi disperdiçá!
A mulher não aguentava mais aquele controle, mas a cada dia, Fofoquinha trabalhava menos - até porque o sogro não queria a sua presença na venda - e mais vigiava a mulher.
Toda noite era a mesma a coisa e a esposa começou a ficar cada dia mais irritada e nervosa, pois os relatórios passaram a ser em tempo real, isto é, no momento em que estava acontecendo.
Como a mulher começou a protestar, Fofoquinha passou a falar sozinho. Porém, o que era para ser apenas um sussurro era ouvido como se fosse uma conversa. Fofoquinha reclamava, falava, discutia, respondia e tudo ao som alto, como se tivesse falando com alguém.
Quando o sogro morreu, Fofoquinha teve que assumir o armazém, entretanto, o lucro diminuía a cada dia, pois o que o palhaço realmente gostava de fazer era controlar a vida da mulher e de tudo que acontecia na casa.
Divido entre o armazém e o controle da mulher, Fofoquinha parecia estar enlouquecendo.
Não demorou para sua mulher começar a fumar e a beber. Mas até isso o marido controlava:
- Muié, cê sabia que esse é o 10º cigarro que ocê fuma? E que ontem ocê conseguiu beber meia garrafa de cachaça?
O tempo foi passando e a mulher achava que ia enlouquecer com tanto controle.
Um dia, o circo em que Fofoquinha foi criado voltou á cidade e os dois foram assistir.
Quando o circo foi embora, Fofoquinha só deu conta da falta da mulher no final da tarde, pois passara o dia deprimido no balcão do armazém.
Rosinha fugiu com o circo, casou-se com o atirador de facas, mas dessa vez quem falava grosso e impunha respeito era ela.
Fofoquinha? Continuou pendurado no balcão do armazém observando a vida sem participar dela.




segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Rádio pirata



Eu trabalhei durante dois anos em uma rádio comunitária. 
Foi assim: Eu precisa de trabalho, procurei um amigo e foi o que ele tinha para me oferecer.
Achei que era o máximo, pois começava na segunda, fácil assim.
Logo que cheguei, encontrei a coisa no bagaço! O trabalho exigia uma faxineira e eu arrumei uma vassoura emprestada nos vizinhos e coloquei a mão na massa! 
Deixei tudo limpinho, depois fui no mercadinho, comprei uns produtos de limpeza e deixei cheirosinho.
Era tudo muito fácil se não fosse essa minha mania de perfeição. Era só receber uns pedidos de música, que raramente chegavam, pois não tinha telefone e a rádio ficava num morro que só eu e meia dúzia de gatos pingados para subir.
Eu comecei a querer arrumar equipamentos, mais propagandas para a rádio funcionar melhor, deixar tudo limpinho e fazer a coisa funcionar direito.
Tudo estava indo muito bem até meu celular tocar e eu ouvir o "dono da rádio" me dar  uma ordem: "Fecha a rádio que a federal está subindo."
Como assim? 
Avisei ao locutor, fechamos tudo e fomos embora.
Ficamos fechados por 15 dias.
Outras rádios locais não tiveram a mesma sorte que a gente e foram fechadas. Depois eu vi na televisão falarem que as rádios comunitárias servia à milícia.
Não era bem assim, a gente entregava documentos perdidos nas vans, celulares e até carteira com pagamento do mês eu entreguei sem receber nem um centavo por isso!
A gente ajudava os moradores locais fazendo campanhas para arrecadar alimentos, roupas, materiais de construção e muitas outras coisas boas.
Como eu tinha entrado sem saber que era errado, sai sabendo que não era o cero, mas era o melhor a fazer.
Algumas vezes, nesse país, todos os gatos são colocados no mesmo saco, infelizmente...

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Ser ou não Ateu



Essa semana fui convidada por uma pessoa que gosto muito para participar de uma mesa de debates sobre religião. De início pensei que isso seria algo muito desgastante, uma vez que tenho frequentado diariamente o Facebook e esse é um local onde as "fogueiras das vaidades" se afloram a cada 1/2 segundo e tudo vira motivo para ofensas e brigas intermináveis!
O motivo dessa pessoa ter me convidado para esse debate foi orque eu sou a única pessoa que ela conhece que se declara claramente ateia e, como falta um na mesa, se lembrou de mim.
Quando digo declaradamente é porque muitas pessoas se declaram católicas porque foram batizadas por seus pais ainda bebês e fizeram a primeira comunhão no colégio quando crianças e casaram em uma igreja para fazer uma bela cerimônia para guardar de recordação, mas nunca, digo nunca, frequentam uma missa sequer. Aliás, difícil é conhecer alguém que realmente faça isso.
Eu posso dizer que todas as pessoas que já conheci durante toda a minha vida, apenas seis pessoas realmente frequentavam a missa, comungava e seguiam todas as normas que eram necessárias para se dizer católico.
A maioria das pessoas dizem que acreditam em deus, mas não tem religião. Essa é para mim a pior e mais cômoda resposta, pois se acredita no deus católico e nem sequer lê os princípios que fundaram   ou que afirmam a existência desse deus, é porque não querem ser olhados como ETs descrentes.
Eu, filha de pai português, que tinha sido seminarista - coisa que só descobri depois que ele morreu - e mãe que foi semi-interna em colégio de freiras, fui batizada bem novinha e fiz minha primeira comunhão aos nove anos de idade.
Para a minha primeira comunhão foi programada uma festa, onde até os parentes que moravam em outro estado foram convidados, pois era um "acontecimento".
No dia anterior à cerimônia, uma tia de minha mãe, que por sinal era Madre Superiora de um tradicional colégio de freiras, resolveu me dar as últimas instruções sobre o que ia acontecer e me deu instruções claras para não morder a hóstia, pois era o corpo de Cristo e minha boca se encheria de sangue.
Adivinhem o que eu fiz?
Sabem o que aconteceu? Nada.
A coisa começou a ficar estranha ai, pois eu comecei a questionar absolutamente tudo.
Depois da primeira comunhão ainda ia para as missas aos domingos, mas comecei a ouvir as história da bíblia como fantasias tais quais contos de fadas ou mitologia grega ou mais uma grande mentira - tal qual a da hóstia.
Depois passeia a questionar a santidade dos padres, pois alguns escândalos envolvendo padres e, até mesmo na paróquia a que pertencíamos e a minha credibilidade foi se esvaindo e a minha fé se foi para sempre.
No começo, a minha falta de fé fez com que eu me sentisse muito desamparada, pois quando desejava muito algo rezava, pedia, esperava por bênçãos. Quando o que esperava, não era alcançado, me conformava com o "livre arbítrio" - de repente não me esforcei tanto assim e deus não ia desmerecer alguém que se esforçou mais só porque eu implorei, eu tive o "livre arbítrio" para escolher me esforçar mais e não fiz.
Depois eu pensei: Se eu tenho que me esforçar, lutar sozinha, correr atrás, eu quero um deus para que?
Abandonei as orações e, com o tempo fui excluindo frases que a gente fala quase naturalmente porque ouve desde criança, do tipo: graças a deus!
Quando os questionamentos começam não param mais. A história de Adão e Eva, por exemplo.
O homem foi feito do barro e a mulher de uma costela desse ser?
Com tanto barro não dava para fazer a mulher dele também?
Brincadeira, gente. Mas é que é um absurdo tão grande que não dá nem para imaginar a possibilidade de uma coisa dessas ser possível.
A Arca de Noé. Qual era o tamanho dessa coisa?
O Titanic afundou e matou um monte de gente e a arca de Noé salvou até as baratas?
Quando me casei, meu marido me fazia ir à missa com ele todos os domingos e aquilo me fazia muito mal porque igreja não é um lugar de debates e cada vez que o padre fazia o seu sermão eu sentia vontade de levantar a mão e fazer algumas perguntas embaraçosas, mas não podia. Mas também não ficava como uma vaquinha de presépio repetindo amém e graças a deus, ficava calada o tempo todo. Todo mundo reparava em mim.
Passei a sair durantes as missas para fumar do lado de fora, fumava muito e o tempo todo, depois parei de ir.
Quero realmente ir a esse debate porque quero fazer aquele monte de perguntas que não podia fazer na igreja. E não aceito a resposta do átomo.
É mais difícil ser ateu do que hipócrita, daqueles que falam que não tem religião, mas acreditam em deus, mas eu sou assim.

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